sábado, 30 de setembro de 2017

Militância e perdas de direitos religiosos

Desde algum tempo, sinto que a palavra militante não é bem-vista. Às vezes, percebo que soa como um palavrão, ou pior, é jocosamente utilizada: “Eita, lá vem o militante.” Se adicionarmos comunista ao vocábulo, danou-se. “Que saco, esse militante-comunista”.

Segundo o Dicionário Online de Português, militante é aquele que milita, que defende uma causa ou busca transformar a sociedade através da ação e não da especulação. Por favor, não confundam com militar ou com miliciano.

Em tempos funestos, onde observamos um endurecimento das instituições e das mentalidades, nunca foi tão necessário lutar por direitos fundamentais. Nunca foi tão necessário militar.

Quem acompanha as redes sociais e jornais teve contato com notícias e vídeos de terreiros invadidos, de praticantes do candomblé e umbanda sendo hostilizados e obrigados a quebrar seus objetos religiosos e sagrados. Somente, em Nova Iguaçu – RJ, esse ano foram registradas oito ocorrências.

“Filipe, são marginais”, diriam alguns. Concordo, são marginais denominados traficantes de Cristo. Então me pergunto. Que hipocrisia é essa? Um traficante que desrespeita as leis constitucionais, assassina, comercializa um  produto que destrói vidas, ataca um terreiro em nome de Jesus Cristo?

Esse atos me remetem as cruzadas, decretada pela igreja católica no século XI. Todos o “cristãos” que matassem um mulçumano para recuperar Jerusalém teria seus pecados perdoados. Ondas de assassinatos, estupros e crimes de toda a natureza foram praticados em nome de Deus, com a certeza da absolvição dada pela Igreja Católica. Logo depois vem a Inquisição, queimando inúmeras pessoas em nome da religião. 

Na modernidade, a situação se repete. Não me assustaria que tais “traficantes de Cristo” fossem insuflados por pastores evangélicos neopentecostais que decidiram banir os terreiros de perto de suas igrejas. Repete-se o rito medievalista. Em nome de Jesus Cristo, tudo pode. Até desrespeitar um dos dez mandamentos - “Não matarás” -; até desrespeitar o ensinamento de Cristo – “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Sem amor, sem piedade, um homem com o título de pai de santo foi assassinado em Fortaleza por se recusar a fechar o seu terreiro.

A liberdade de religião e crença é um direito fundamental presente na carta do “Direitos Humanos Universais”. Carta essa, que o Brasil, pátria amada gentil, é um signatário e chancela em sua Constituição a situação de Estado Laico. Laicidade que deveria garantir a todos o direito de exercer sua crença em segurança.

Não vejo essa laicidade em prática. Os homens e mulheres de bem que enchem o peito para se dizer honestos fecham os olhos à opressão de compatriotas. Ou essas mães, pais, filhas e filhos de santos não são brasileiros, não são seres humanos com direito à vida?

Levantar-se contra a injustiça é militar, é lutar pelo bem. Não adianta ser um bom católico dentro da igreja, um bom evangélico dentro do templo ou um candomblecista ou umbandista dentro de seu terreiro. Os ensinamentos de amor ao próximo, conceito difundido em várias religiões tem que ser colocado em prática. Tem que estar nas ruas.

Pergunto, onde estão as cartas de repúdio, redigidas por bispos, ulemás, rabinos, pastores, budistas, ateus, agnósticos, contra os atos de intolerância religiosa  praticados contra os povos de terreiro? Se perderão no silêncio?

O silêncio é a maior das conivências. Ser conivente, nos torna cumplices de assassínios, cumplices da perversidade.

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