Segundo uma edição do dicionário Aurélio que possuo, muito antiga por sinal, Senzala é um substantivo feminino que significa “casa ou alojamento de escravos; casa imunda que serve de morada para vadios e desordeiros; maloca.”
Em pleno treze de maio, data que foi promulgada a
Lei Aurea, penso o que leva alguém a batizar um restaurante com esse nome. Será
o analfabetismo histórico ou o racismo?
Antes que atirem a primeira pedra, não me refiro
somente ao estabelecimento em São Paulo, que virou notícia nas últimas semanas.
Existem outros, aqui na cidade, onde o horizonte não é mais tão belo, há dois
bares com o nome.
O que faço nesse texto é convidá-los a pensar sobre
a luta contra o racismo no Brasil. Realmente, o vencemos? Temos uma sociedade
desprovidada de preconceito racial, que garante oportunidades iguais para
todos?
Analisamos a primeira parte do significado dada
pelo dicionário: “casa ou alojamento de escravos”. Eram pocilgas onde negros
escravizados passavam a noite, após longo dia de trabalho e chibatadas. Após
retornarem do campo, ali, na senzala, tinham que se acomodar. Quando o último entrava,
as portas eram trancadas. Ao invés de casa, deveria ser chamada de prisão.
O segundo conceito, “casa... para vadios e
desordeiros” criminaliza aqueles que vivem na senzala. Ou seja, criminaliza o
negro, pois era ele que lá estava aprisionado.
Após a Lei Aurea, promulgada em 13 de maio de 1888,
o negro brasileiro foi impedido pelo Estado de ter acesso à terra. A mão de
obra imigrante passa a ser bem recebida. O Estado brasileiro tinha a política
de criar uma nova Europa branca, como relata Darcy Ribeiro, em O Povo
Brasileiro. Essa política empurrou a população negra para a miséria e para o
desemprego.
Poucos anos depois, durante a ditadura do Estado
Novo (1937 – 1945), o governo varguista institui a lei da vadiagem. “Entregar-se
alguém habitualmente a ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que
lhe assegure meios bastantes de subsistência...” funcionava como pretexto para
que a polícia encarcerasse, sem motivo algum um negro inocente, pobre que
estivesse desempregado. Que o mandasse para a prisão, para a senzala que é o
lugar dos vadios.
Após cortar acesso ao emprego, o Estado brasileiro
criminaliza o negro, como o conceito utilizado no dicionário também o faz. Situações
que contribuem para aumentar o preconceito e o racismo.
Enfim, não cabe usar a palavra “senzala”
figurativamente, apenas literalmente. Ela carrega o asco do racismo e da escravidão. Ao exibi-la em
uma placa, a mensagem passada é que ali, naquele estabelecimento, se fortalece o
racismo; principalmente, quando brancos estão sentados à mesa sendo servidos
por negros.
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